Escatologia
é o ramo da teologia que estuda as últimas coisas, os acontecimentos finais.
Estudar escatologia é buscar o conhecimento do fim do mundo e dos
acontecimentos que virão. Alguns estudiosos também falam de escatologia como o
“processo de esperança da salvação em Deus” (Volney Berkenbrock – A Escatologia
na Bíblia).
Nesse sentido podemos perceber que escatologia, resumidamente, é o
estudo que aponta para o futuro. Um futuro que virá sob a direção divina e
mostrará uma nova realidade humana, concretizando a vitória absoluta do bem
sobre o mal.
Esperança
escatológica é uma expressão também usada por vários estudiosos das ciências
bíblicas. Esperança escatológica é o somatório de dois termos muito fortes e de
significado absolutamente profundo e motivador. Esperança e busca pelas últimas
coisas. Com certeza, esperança escatológica é uma maneira mais profunda de
exercitar a fé.
Esperança
escatológica é o sentido mais profundo do sonho, da espera, da busca e do
desejo pela “consumação dos séculos” dita por Jesus Cristo na grande comissão em
Mateus 28:18-20. Esperança escatológica é a força que move o ser humano para a
conquista de uma vida melhor. Esperança escatológica é a resposta divina para a
superação dos grandes obstáculos que a vida naturalmente coloca diante de todos
nós. É a vitória do amor sobre o ódio, da certeza sobre a dúvida, da paz sobre
o medo, da vida sobre a morte.
O
caminho da humanidade tem como combustível motivacional e espiritual essa esperança
de melhores dias no futuro. A narrativa do texto bíblico de Gênesis 3:15 mostra
a principal promessa divina sobre a esperança de redenção: “Porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua descendência e a
sua descendência; esta te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar”.
Em
face da desobediência humana o Deus criador afirma que a vitória virá. O filho
descendente da mulher vencerá finalmente esmagando a cabeça da serpente. No
novo testamento o Apóstolo Paulo explica muito bem o cumprimento dessa promessa
na sua carta aos Romanos 5:12-21: “Porque,
se pela ofensa de um só, a morte veio a reinar por esse, muito mais os que
recebem a abundância da graça, e do dom da justiça, reinarão em vida por um só,
Jesus Cristo. Para que, assim como o pecado veio a reinar na morte, assim
também viesse a reinar a graça pela justiça para a vida eterna, por Jesus
Cristo nosso Senhor”(v.17,21).
A esperança
escatológica na história bíblica
1. Abraão – o pai
da fé.
Uma
das lições mais profundas da vida de Abraão é a fé inabalável. Desde o começo
até o final ele é um exemplo de esperança escatológica. Neste texto a seguir
vemos o chamado de Abraão. Ele foi chamado para sair de sua terra e ir para
outro lugar e esperar as promessas de Deus. Essa promessa seria bênção para
todas as famílias da terra. “Ora, o
Senhor disse a Abrão: Sai-te da tua terra, da tua parentela, e da casa de teu
pai, para a terra que eu te mostrarei. Eu farei de ti uma grande nação;
abençoar-te-ei, e engrandecerei o teu nome; e tu, sê uma bênção. Abençoarei aos
que te abençoarem, e amaldiçoarei àquele que te amaldiçoar; e em ti serão
benditas todas as famílias da terra” (Genesis 12:1-2).
Abraão
foi chamado quando tinha 75 anos e Deus prometeu um filho legítimo (Gn. 12:4). O
filho Isaque nasceu quando ele tinha 100 anos (Gn. 21:5). Estava com 127 anos
quando Sara veio a falecer. Ele morreu aos 175 anos (Gn.25:7). Toda uma vida na
esperança de dias melhores. Uma vida sintonizada entre presente e futuro. Este
é um exemplo vivo de esperança escatológica.
Em
Gênesis 15 encontramos o registro de um encontro de Deus com Abraão. O texto
fala que depois de uma guerra Deus viu que Abraão estava abatido e triste.
Então, o Senhor reafirma as primeiras promessas e manda que ele olhe para os
céus e que conte as estrelas. A escritura diz que Abraão creu na promessa de
Deus e isso foi lhe imputado como justiça. O apóstolo Paulo, depois, explica, de forma objetiva,
sobre o caráter da fé desse patriarca: “[Abraão]... o qual, em esperança, creu contra a esperança, para que se
tornasse pai de muitas nações, conforme o que lhe fora dito: Assim será a tua
descendência; e sem se enfraquecer na fé, considerou o seu próprio corpo já
amortecido (pois tinha quase cem anos), e o amortecimento do ventre de Sara;
contudo, à vista da promessa de Deus, não vacilou por incredulidade, antes foi
fortalecido na fé, dando glória a Deus, e estando certíssimo de que o que Deus
tinha prometido, também era poderoso para fazer. Pelo que também isso lhe foi
imputado como justiça. Ora, não é só por causa dele que está escrito que lhe
foi imputado; mas também por causa de nós a quem há de ser imputado, a nós os
que cremos naquele que dos mortos ressuscitou a Jesus nosso Senhor”
(Romanos 4:18-25).
O
escritor de Hebreus afirma de maneira muito clara: “Pela fé Abraão, sendo chamado, obedeceu, saindo para um lugar que
havia de receber por herança; e saiu, sem saber para onde ia. Pela fé
peregrinou na terra da promessa, como em terra alheia, habitando em tendas com
Isaque e Jacó, herdeiros com ele da mesma promessa; porque esperava a cidade
que tem os fundamentos, da qual o arquiteto e edificador é Deus” (Hebreus
11:8-10).
2. Moisés – o
libertador.
Moisés
era uma pessoa tímida e medrosa, mas foi um grande líder usado como instrumento
de Deus para libertação de Israel da escravidão do Egito. A escravidão já é um
desafio para a esperança escatológica. Um povo chamado para transmitir os
oráculos de Deus não poderia perecer e ser escravo eternamente. “Então disse o Senhor: Com efeito tenho
visto a aflição do meu povo, que está no Egito, e tenho ouvido o seu clamor por
causa dos seus exatores, porque conheço os seus sofrimentos; e desci para o
livrar da mão dos egípcios, e para o fazer subir daquela terra para uma terra
boa e espaçosa, para uma terra que mana leite e mel. E agora, eis que o clamor dos filhos de Israel é vindo a mim; e também
tenho visto a opressão com que os egípcios os oprimem. Agora, pois, vem e eu te enviarei a Faraó,
para que tireis do Egito o meu povo, os filhos de Israel” (Êxodo 3:7-10). As orações chegaram aos ouvidos de
Deus e Ele no seu tempo agiu poderosamente para cumprir a sua vontade e veio a
libertar o povo da promessa. Promessa feita a Abraão e cumprida a cada dia
sobre nós, como bênção a todas as famílias da terra.
É
possível também perceber a esperança escatológica na jornada de Israel no
deserto caminhando em direção à terra prometida. Um povo que sai de uma vida de
escravidão no Egito e caminha em direção a um lugar desconhecido. Uma caminhada realizada
absolutamente pela fé e confiança em Deus. Esta esperança esteve presente, também, na
vida de Josué e Calebe. O remanescente fiel que foi premiado com a entrada e
conquista da terra prometida.
Nesse
sentido encontramos uma explicação neo-testamentária desse importante evento nas
cartas paulinas. “Pois não quero, irmãos,
que ignoreis que nossos pais estiveram todos debaixo da nuvem, e todos passaram
pelo mar; e, na nuvem e no mar, todos
foram batizados em Moisés, e todos
comeram do mesmo alimento espiritual; e
beberam todos da mesma bebida espiritual, porque bebiam da pedra espiritual que
os acompanhava; e a pedra era Cristo. Mas Deus não se agradou da maior parte deles;
pelo que foram prostrados no deserto. Ora, estas coisas nos foram feitas para
exemplo, a fim de que não cobicemos as coisas más, como eles cobiçaram. Não vos torneis, pois, idólatras, como alguns
deles, conforme está escrito: O povo assentou-se a comer e a beber, e
levantou-se para folgar. Nem nos
prostituamos, como alguns deles fizeram; e caíram num só dia vinte e três mil. E não tentemos o Senhor, como alguns deles o
tentaram, e pereceram pelas serpentes. E não murmureis, como alguns deles
murmuraram, e pereceram pelo destruidor. Ora, tudo isto lhes acontecia como
exemplo, e foi escrito para aviso nosso, para quem já são chegados os fins dos
séculos. Aquele, pois, que pensa estar em pé, olhe não caia. Não vos sobreveio
nenhuma tentação, senão humana; mas fiel é Deus, o qual não deixará que sejais
tentados acima do que podeis resistir, antes com a tentação dará também o meio
de saída, para que a possais suportar” (1Co. 10:1-13). Dessa maneira,
podemos perceber que a força que motivava a caminhada no deserto era a
esperança escatológica. Por outro lado, a murmuração e a falta de fé foi o
caminho para a perdição.
3. Davi – ensino
da esperança messiânica.
Um dos reis de Israel que merece
destaque na história bíblica foi Davi. Um homem chamado segundo o coração de
Deus que sempre foi um homem de grandes contrastes. A história registra Davi como
um homem revelado por sua força, sua fé e a sua fraqueza. Um rei escolhido e
ungido para fundamentar a estrutura judaica que mereceu destaque pelo início da
construção do templo.
Um aspecto importante que podemos
destacar da parte de Davi foram seus escritos em forma de poema. O livro de
Salmos fazia parte da história de Israel por conter as letras das melodias
cantadas por um povo responsável por conservar os oráculos de Deus. Davi é o
maior compositor dos Salmos e em vários momentos fala da esperança escatológica
através da vinda do Messias. O Messias representa aquele que haveria de vir
para redimir e guiar Israel nos caminhos da eterna prosperidade.
Os ensinos de Davi estão presentes
nas poesias e expressões de louvor a Deus que encontramos no livro dos Salmos.
Há vários salmos que contêm uma clara mensagem messiânica. O Salmo 69 fala do lamento
do Messias. Já o Salmo 72 mostra o reino e o reinado justo: “Ó Deus, dá ao rei os teus juízes, e a tua
justiça ao filho do rei. Os seus dias
floresçam a justiça, e haja abundância de paz enquanto durar a lua. Domine de
mar a mar, e desde o Rio até as extremidades da terra. Permaneça o seu nome
eternamente; continue a sua fama enquanto o sol durar, e os homens sejam
abençoados nele; todas as nações o chamem bem-aventurado. Bendito seja o Senhor
Deus, o Deus de Israel, o único que faz maravilhas. Bendito seja para sempre o
seu nome glorioso, e encha-se da sua glória toda a terra. Amém e amém”(Salmo
72:1,7-8-17-19). Ele proclama a vinda do Messias. O Messias era a esperança
escatológica encarnada. Era a ação divina de maneira triunfante e poderosa na
vitória completa sobre os inimigos.
4. Jeremias - o
exílio babilônico.
Um dos eventos históricos que mais
influenciou os escritos do Velho Testamento é o exílio babilônico. No ano 587 a.C. Jerusalém
foi invadida e o templo sagrado foi destruído pelo rei Nabucodonozor. A maioria
dos judeus foi levada como escravos para a Babilônia e este evento tão triste
para os judeus foi previsto por vários profetas. Jeremias é um desses que proclamou a vontade de Deus e a disciplina do
Senhor.
Aqui está a mensagem através de uma
carta para os deportados para a Babilônia: “Assim
diz o Senhor dos exércitos, o Deus de Israel, a todos os do cativeiro, que eu
fiz levar cativos de Jerusalém para Babilônia: Edificai casas e habitai-as;
plantai jardins, e comei o seu fruto. Tomai mulheres e gerai filhos e filhas;
também tomai mulheres para vossos filhos, e dai vossas filhas a maridos, para
que tenham filhos e filhas; assim multiplicai-vos ali, e não vos diminuais. E
procurai a paz da cidade, para a qual fiz que fôsseis levados cativos, e orai
por ela ao Senhor: porque na sua paz vós tereis paz. Pois assim diz o Senhor
dos exércitos, o Deus de Israel: Não vos enganem os vossos profetas que estão
no meio de vós, nem os vossos adivinhadores; nem deis ouvidos aos vossos
sonhos, que vós sonhais; porque eles vos profetizam falsamente em meu nome; não
os enviei, diz o Senhor. Porque assim diz o Senhor: Certamente que passados
setenta anos em Babilônia, eu vos visitarei, e cumprirei sobre vós a minha boa
palavra, tornando a trazer-vos a este lugar. Pois eu bem sei os planos que
estou projetando para vós, diz o Senhor; planos de paz, e não de mal, para vos
dar um futuro e uma esperança. Então me invocareis, e ireis e orareis a mim, e
eu vos ouvirei. Buscar-me-eis, e me achareis, quando me buscardes de todo o
vosso coração. E serei achado de vós, diz o Senhor, e farei voltar os vossos
cativos, e congregar-vos-ei de todas as nações, e de todos os lugares para onde
vos lancei, diz o Senhor; e tornarei a trazer-vos ao lugar de onde vos
transportei.” (Jer 29:1-14).
Assim, podemos aprender sobre a ação
de Deus permitindo que seu povo fosse disciplinado. Nesse evento o povo deveria
ir e viver em terra estranha, porém deveriam saber que estavam passando o
sofrimento como disciplina de Deus e que
um dia eles iriam voltar. Essa esperança da volta deveria ser a sustentação da
fé de um povo humilhado. Deus nunca os abandonaria. E assim se fez. No tempo
certo eles voltaram para reconstruir a cidade e o templo novamente, Essa é a
história registrada por Esdras e Neemias.
5. Novo testamento
- Jesus Cristo e os Apóstolos: Paulo e João.
No
novo Testamento, as palavras de Jesus Cristo, nosso Senhor, falam profundamente.
Temos também as palavras dos apóstolos Paulo e João.
Jesus
nos ensina que haverá um fim dos tempos e a consumação dos séculos: “Porque, assim como o relâmpago sai do
oriente e se mostra até o ocidente, assim será também a vinda do filho do
homem. Pois onde estiver o cadáver, aí se ajuntarão os abutres. Logo depois da
tribulação daqueles dias, escurecerá o sol, e a lua não dará a sua luz; as
estrelas cairão do céu e os poderes dos céus serão abalados. Então aparecerá no
céu o sinal do Filho do homem, e todas as tribos da terra se lamentarão, e
verão vir o Filho do homem sobre as nuvens do céu, com poder e grande glória. E
ele enviará os seus anjos com grande clamor de trombeta, os quais lhe ajuntarão
os escolhidos desde os quatro ventos, de uma à outra extremidade dos céus”
(Mateus 24:17-31).
O
apóstolo Paulo escreve aos irmãos da cidade de Tessalônica e numa parte
importante fala da vinda do Senhor: “Mas,
irmãos, acerca dos tempos e das épocas não necessitais de que se vos escreva: porque
vós mesmos sabeis perfeitamente que o dia do Senhor virá como vem o ladrão de
noite; as vós, irmãos, não estais em trevas, para que aquele dia, como ladrão,
vos surpreenda; porque todos vós sois filhos da luz e filhos do dia; nós não somos
da noite nem das trevas; não durmamos, pois, como os demais, antes vigiemos e
sejamos sóbrios. Porque os que dormem, dormem de noite, e os que se embriagam,
embriagam-se de noite; mas nós, porque somos do dia, sejamos sóbrios,
vestindo-nos da couraça da fé e do amor, e tendo por capacete a esperança da
salvação; porque Deus não nos destinou para a ira, mas para alcançarmos a
salvação por nosso Senhor Jesus Cristo, que morreu por nós, para que, quer
vigiemos, quer durmamos, vivamos juntamente com ele” (I Tess 5:1-10).
Finalmente,
encontramos a esperança escatológica nos escritos do apóstolo João,
especialmente em Apocalipse. É de fundamental importância a lembrança do
contexto de Apocalipse. A carta escrita como uma revelação sobre os
acontecimentos finais serviria de consolo para os primeiros cristãos que
passavam por grandes perseguições e sofrimentos. Única esperança daqueles primeiros cristãos
era a pessoa e a obra de Deus através do seu Filho enviado para estabelecer a
vitória final. O maior ensinamento do livro da revelação é a fé, a esperança e
a vigilância: “Bem aventurado aquele que
lê e bem-aventurados os que ouvem as palavras desta profecia e guardam as
coisas que nela estão escritas; porque o tempo está próximo” (Ap. 1:3). “Eis que cedo venho e está comigo a minha
recompensa, para retribuir a cada um segundo a sua obra. Eu sou o Alfa e o ômega,
o primeiro e o derradeiro, o princípio e o fim. Bem aventurados aqueles que
lavam as suas vestes [no sangue do Cordeiro] para que tenham direito à arvore
da vida, e possam entrar na cidade pelas portas. Aquele que testifica estas
coisas diz: Certamente cedo venho. Amém; vem, Senhor Jesus (Ap.22:12-14,20).
Conclusão
Diante do exposto, algumas considerações precisam ser reafirmadas:
- A
Esperança escatológica é uma soma de fé, esperança e vigilância.
- A
Esperança escatológica é a força que sustentou e tem sustentado os servos
de Deus em todos os tempos.
- A Esperança escatológica é tão forte e importante quanto a concretização da promessa de Deus.
Assim,
a maior lição que sustentamos sobre esperança escatológica é que ela não é apenas
uma especulação sobre os acontecimentos futuros ou o entendimento correto das profecias
e dos dias finais sem explicação coerente. Esperança escatológica
fortalece a nossa vida espiritual e alimenta a alegria interior para manter a
nossa fé inabalável. “Ora, a fé é a
certeza das coisas que se esperam, e a convicção de fatos que não se vêem”
(Hebreus 11:1).